O artigo de Ihering (1907) é a tradução de um opúsculo publicado em inglês por ocasião da Exposição Universal de Saint Louis (EUA), em 1904 (Ihering 1904). Enquanto a versão original em inglês não inclui material lingüístico, a tradução brasileira inclui os vocabulários Oti ("Eochavante") de Telêmaco Borba e Ewerton Quadros, além de alguns itens lexicais Kaingáng e "Notobotocudo" (Xetá).
Sugerindo que "a língua dos Eochavantes parece ser um tanto alliada á dos Gês", Ihering dá início à idéia (sem fundamento) de que o Oti seria geneticamente relacionado às línguas Jê (idéia adotada mais tarde por Greenberg). Também digna de nota é a opinião de Ihering (que, como respeitado naturalista e diretor do Museu Paulista, era um dos principais nomes da ciência no Brasil de então) sobre o destino que se devia dar aos índios de São Paulo (p. 215):
"Os actuaes indios do Estado de São Paulo não representam um elemento de trabalho e de progresso. Como tambem nos outros Estados do Brazil, não se póde esperar trabalho sério e continuado dos indios civilizados e como os Caingangs selvagens são um impecilio para a colonização das regiões do sertão que habitam, parece que nao ha outro meio, de que se possa lançar mão, senão o seu exterminio."
Embora este artigo seja essencialmente uma versão em português do trabalho divulgado em St. Louis, este parágrafo e o que o segue não ocorrem na versão original em inglês (um fato que parece ter passado despercebido mesmo entre autores que se dedicaram detidamente a este texto). É interessante indagar o que teria levado ao acréscimo deste trecho, que tanta polêmica geraria, à versão brasileira (ou sua supressão na versão em inglês). É possível que Ihering considerasse tais afirmações como potencialmente "chocantes" para um público "mais civilizado"; parece-me mais provável, no entanto, que o trecho tenha sido acrescentado como propaganda para consumo interno, dado o clima político-acadêmico da época (para o qual, vide Penny 2003).